segunda-feira, 25 de outubro de 2010

A CIGARRA E O CINZEIRO

quando a tarde cai cinza assim
e a cigarra faz alarde lá na Barra
é sinal do fim senão é pirraça
pois quando a cinza, ai, não dói
não tem mais jeito, é que do peito
feito fumaça o amor se foi

então é um novo sarro, uma só farra
e onde ancoro meu veleiro?
choro um mar sobre o cinzeiro e canto
no cais mais um cigarro e sem amarras
não demoro em não ter rumo
moro ao léu e fumo, fumo tanto...

quinta-feira, 8 de julho de 2010

A CULPA

ah, que se o amor não é mais como antes, meu bem, deve ser

do mundo que gira ou de uma outra mulher a culpa. deve ser

do tempo que passa e das rugas distantes do rosto, mas vistas

de longe no fundo da alma; do gosto que muda de quando em vez.


calma! espere por mim (de novo e sempre um carinho se fez).

não vale a pena sangrar por sangrar, crescer de véspera,

fugir diante das palmas, lembrar de rolar um pranto, enfim...

não durma antes de sonhar.


letra fred sommer música áureo gandur

sexta-feira, 11 de junho de 2010

CAFÉ

tá na ponta da língua tá na cara
tá na pauta dos sábios guapos locos
tá nos lábios da virgem tá na conta
dos encontros não falta coisa rara
e eu querendo ser óbvio como poucos
tenho sido a mais cara das afrontas
ando rouco de rock e canto triste
já to seco de pranto e não sorrio
não me toque não largue minha mão
não é nada mas tudo quanto existe
é o ladrão e o ladrar do dono é o cio
é o sono é o penar e é o perdão


letra fred sommer música daniel green

BOOM

big bang
nosso amor se dá
bem no mangue
veja a flor brotar
seja onde for
nosso sangue
nem sequer a dor
bang bang
quem vai separar
uma gangue
já ninguém mais pode
contra o nosso amor
quando amém explode

letra fred sommer música aureo gandur

DUET

Macbeth
lady má
corre pela sombra
por entre alçapões

pinta o set
lua-nova meia-noite
raras poções
mágicos tabletes

corações
de papel picado
feito confete
sobressaltados
zanzam no ar
e perdem-se no tapete

ai se cada hora
e cada passo fosse em vão
let’s go vambora
badalar
dim dom dim dom

Hamlet
quem será?
quem será que não?
eis as suas questões

palacete
meia-lua noite adentro
assombrações
quase tete-a-tete

foliões
mal fantasiados
de baronetes
esganiçados
saem a cantar
a história que se repete

sete notas
si dó ré mi fá sol lá se vão
ai se cada gota
de luar
fosse canção

letra e música fred sommer

SOBERBO

e Terê como vai?
por aqui tudo okay
sou amigo do rei
té que o trono se cai, passeio nu

caio em casa de brou
toco o trampo na flauta
sinto té tua falta
um ombro antigo, tô tão jururu

troco almoço por janta
quando a janta é responsa
sou amigo da onça
té que mostra a garganta, a la Gadu

alcatrão e conhaque
axé e exu
ao som de Dani Black
e Aureo Gandur
se Terê já não vai
ao Grajaú
eu que não fico

e Terê como vai?
dá lembrança ao petiz
por aqui sou feliz
té que o crédito sai, grato ao Gugu

por fulana de tal
moça té bem casada
não perdi a piada
hoje o brou é rival, mas que rebú...

sou, porém, de outra mina
té nem tem muito tempo
sonha já casamento
trata por Carolina, meu chuchu!

té que um dia eu te vejo
ói meu angu
minha mãe quele beijo
i love you
quele abraço no pai
e no Bidu
do Frederico


letra fred sommer música aureo gandur

DELEGADO

delegado veja bem
o meu marido não sabe de nada
não faz batucada
partido não tem
devoto de Santo Expedito
desperta ao apito
do primeiro trem
trabalha sábado e domingo
não faz fé no bingo
nem mal a ninguém

tenha bondade
cara autoridade
já é carnaval
permita à vida
ser mais colorida
ali na Avenida Central
um advogado vou tratar
e trago um bolo de fubá
pois só me resta
ver passar a festa
sem gingado e sem par

fez da cela o seu quintal
fantasia da prisão
sei que o amor é um carnaval
penal é viver de ilusão

delegado veja bem
o meu marido não sabe de nada
não faz batucada
partido não tem
devoto de Santo Expedito
desperta ao apito
do primeiro trem
trabalha sábado e domingo
não faz fé no bingo
nem mal a ninguém

cambaleando
por entre vielas
vêm dois foliões
e vem cantando
a Camisa Amarela
(antiga aquarela) aos semitons
mas que danado
olhe o delgado
junto da ralé
mas que bandido
olhe o meu marido
de assunto com outra qualquer

fez do mundo o seu quintal
carnaval da minha dor
prendo os sonhos no varal
secando a ilusão que é o amor

letra fred sommer & pedro barnez música luis kiari & áureo gandur

RANDEVU

meu caro poeta
das noites em claro
do vão da sarjeta
dos dias de luto
teu faro decida
se sirvo ou se paro
mas lembra que a vida
não vale o minuto

não sejam as moças
lá muito pudicas
e nem pouca vod-
ka dica de irmão
do fundo da fossa
não passas: quem fica
de toca não pode
cantar meu baião

ó santo poeta
sem rastro e sem manto
sem mastro nem meta
mas só solidão
enquanto o deserto
não seca este pranto
te tenho por perto
te deito nas mãos

não sejam os laços
porém tua casa
a vodka é tanta
que pode calar
os tempos escassos
e até te dar asas
o triste acalanto
insiste em me achar

poeta melhor
que mude o assunto
e seja mais só
que tu e eu juntos
mais baixo calão
nesse randevu
não há meu irmão
do que eu ou tu

letra fred sommer & caio sóh música fred sommer

JARDIM DE ALAH

trago no peito uma flor do sertão
um pedaço de terra batida
uma leve impressão de calor
um mormaço, uma longa ferida
um breve baião e uma voz de cantor

vim dar no Rio de favor, violão
sob o braço, a marca da lida
na pele, perdão, meu amor
meu cangaço, o Leblon me convida
e dele é que não faço pouco eu vou

minha guia, meu colar
coração à toa, ao léu
vou até onde o vento levar
e lamento se um dia prometi o céu
e a João Pessoa voltar
com trocentos mirréis no chapéu

púrpura tarde, corante das seis
arauto da noite que arde feliz
do alto o Mirante me espia aos seus pés
eu enfrento seus olhos covardes gigantes rubis

vi a mais bela musa da televisão
ao meu lado ligeira passar
um senhor bem trajado vender emoção
adoidado e rosa amarela a quem queira cheirar

levo no corpo a cor do verão
e um traço de cada avenida
na palma da mão, cá estou
um abraço, sem mais despedidas
de alma e de pão vive um bom trovador

vou me deitar ao rumor do trovão
no cansaço da moça despida

me cabe um desvão, um suor
um colapso me apressa a partida
e quem sabe o Leblon seja o fim, seja a flor

minha guia, meu chapéu
mocassim à beira-mar
vou com as pernas urgentes de réu
inocente por vias eternas, andar
pela Delfim Moreira, pinel
e contente de nunca chegar

súbito a luz desponta através
do palco de estrelas, ó nua atriz
se apruma e se apronta de talco (ou de giz?)
novamente se despe e recua na ponta dos pés

e na Praça Cazuza eu vi um barão
carmesim de tão nobre chamar
lá vou eu como vim: trovador, violão
mocassim, rumo ao céu que recobre o Jardim de Alah

letra fred sommer música luis kiari

RUTH

lembro de ti
pedindo perdão por mais
um dia de solidão
me lembro feliz
das noites de vendavais
procurando tua mão
vem e me diz
quem cuida dos teus papéis
dos calos dos teus pés
da tosse e da bebedeira
tudo o que fiz
sem esperar anéis
nem volta antes das dez
ou uma nova geladeira
mas quem te vê
quem te viu... (pelos bordéis)
já nem sei mais quem tu és
tão magro assim
de barba por fazer
quem há de ter dó?
e quanto a mim
- não me olha de revés -
disponho de alguns mirreis
sou minha e se queres saber:
não sou mais tão só!

letra fred sommer música áureo gandur

JOGADOR

o meu verso vem de berço
vem da Barsa controverso
lebre à noite é gato pardo
vendo à vista vejo em partes
prezo um prazo sai fiado
cobro o preço do meu fardo
já não peço em troca agrado
quero artista desvendar-te
quero a arte que me cabe
deste esporte: ser poeta
de porte ou atleta quem sabe
de sorte (amor na roleta...)
quanto à morte de onde meço
não é meta e sim começo
não o norte sou meu guia
a seta não alvo a via
a reta a linha e o corte
meu forte? minha veneta
me procuro ou quem comporte
como um muro esta faceta

letra fred sommer música áureo gandur